OS SUJEITOS (Segurado, Tomador e Seguradora) DO SEGURO GARANTIA JUDICIAL
OS
SUJEITOS (Segurado, Tomador e Seguradora) DO SEGURO GARANTIA JUDICIAL
A definição exata dos sujeitos no
seguro garantia é uma das especificidades mais importantes em face a outros
ramos securitários, que se estruturam em uma relação direta entre a seguradora
e o segurado irradiando efeitos jurídicos para terceiros determinados ou
indeterminados.
Invariavelmente, tem-se no
seguro garantia: i) o segurado é o credor
da obrigação principal devida pelo tomador e destinatário da garantia
securitária devida pela seguradora; ii) o tomador é o devedor da
obrigação principal para o segurado que opta por contratar o seguro, que paga o
prêmio e tem o seu acervo patrimonial como base do rating financeiro para obtenção do crédito segurado, bem como tem o
ônus de firmar o contragarantia em favor da seguradora; iii) a seguradora que
protege o legítimo interesse do segurado quanto ao fiel cumprimento da
obrigação em razão do risco de inadimplemento do tomador e deste receberá o
prêmio.
As condições especiais da
modalidade VI, do anexo I, definem no item 2, que, no seguro garantia judicial,
o segurado é o “potencial credor de
obrigações pecuniárias” discutidas no processo e o tomador é o “potencial devedor que deve prestar garantia
em controvérsia submetida à decisão do Poder Judiciário.”
O segurado e suas
especificidades foi tema de artigo próprio, principalmente, quanto à impossibilidade
lógica de o juiz da ação ser o segurado da garantia securitária. Recordando o
que já foi escrito, o segurado será a outra parte da ação, o destinatário da
garantia da apólice, o “possível credor” da
obrigação discutida no processo atrelada ao risco de inadimplemento do tomador
e nunca o juízo, que apenas opera como instrumento da administração pública
para pacificação social através do poder jurisdicional. [i]
O tomador, por sua vez,
participa diretamente da contratação do seguro para proteger o interesse do
segurado quanto ao risco de inadimplemento da obrigação principal discutida no
processo judicial, da qual também faz parte e que, inclusive, também tem legítimo
interesse na solução da demanda, inclusive, busca obter concessões processuais
para discussão das questões fáticas e jurídicas do seu direito através de
efeito suspensivo ou liminar de antecipação de mérito.[ii] Ele
é o responsável por pagar o prêmio à seguradora (Circular 477/13, art. 11) e
seu acervo patrimonial servirá de base para a avaliação do risco e obtenção de capacidade
operacional (Circular 477/13, art. 17). Ele, ainda, será o responsável pela pactuação
com a seguradora do instrumento de contragarantia independente dos direitos do
segurado, que respaldará e viabilizará o regresso contra si em caso de sinistro
com pagamento da indenização (Circular 477/13, art. 21 e CC, art. 786). O
tomador, ainda, é obrigado a solicitar a renovação da apólice com 60 dias de
antecedência do término da vigência, salvo se comprovar i) não existir mais o risco segurado ou ii) que o risco esteja garantido por outro instrumento (modalidade
VI, Anexo I, item 4.1 e 4.1.1).
Um aspecto prático
importantíssimo do tomador é que ele detém o direito de que a apólice seja
aceita no processo judicial, salvo se houver i) insuficiência de garantia em face do valor da obrigação
principal, ii) vício formal insanável
e/ou iii) inidoneidade da
garantidora.
O Ministro Ricardo Villas Bôas
Cueva, da 3ª Turma do STJ, no REsp n. 1.691.748-PR foi assertivo:
“10. Dentro do
sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial produzem os
mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não
podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito
formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.” (grifo nosso).[iii]
O
Desembargador Federal Rovirso Aparecido Boldo, do TRT da 2ª Região, aponta que
a rejeição do seguro garantia judicial como espécie de garantia do juízo nos embargos
à execução provisória pelo juiz trabalhista, desde que preenchidas as exigências
do § 2º, do artigo 835, do Código de Processo Civil, afronta direito líquido e certo
do tomador resultado na concessão de ordem em Mandado de Segurança contra o
juiz de origem:
“Destarte,
plenamente aceitável a garantia da execução por meio de apólice de seguro
judicial, desde que em valor superior ao débito e acrescido de 30%, nos termos
do § único do art. 848, do CPC e da OJ 59, da SDI-II, do TST. A decisão que
recusa seguro garantia judicial oferecido dentro dos parâmetros traçados pela
legislação e jurisprudência apontada viola direito líquido e certo.” (grifo nosso)[iv]
A utilização do seguro garantia
judicial no processo é um direito do tomador seja em razão do Código de Processo
Civil, que o equiparou à dinheiro para fins de penhora e caução (CPC, § 2º,
artigo 835), bem como em razão do benefício econômico, financeiro, operacional e
de segurança jurídica para as partes litigantes, conforme aponta o Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva:
“9. No cumprimento
de sentença, a fiança bancária e o seguro garantia judicial são as opções
mais eficientes sob o prisma da análise econômica do direito, visto que reduzem
os efeitos prejudiciais da penhora ao desonerar os ativos de sociedades
empresárias submetidas ao processo de execução, além de assegurar, com eficiência
equiparada ao dinheiro, que o exequente receberá a soma pretendida quando
obter êxito ao final da demanda. [...]
11. Por serem automaticamente
conversíveis em dinheiro ao final do feito executivo, a fiança bancária e o
seguro garantia judicial acarretam a harmonização entre o princípio da máxima
eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o
executado, a aprimorar consideravelmente as bases do sistema de penhora
judicial e a ordem de gradação legal de bens penhoráveis, conferindo maior
proporcionalidade aos meios de satisfação do crédito ao exequente.” (grifo
nosso)[v]
Em aperta e superficial síntese,
o tomador compra a cobertura securitária para adquirir o prolongamento do espaço-tempo no trâmite
processual viabilizando a discussão de questões jurídicas e fáticas relevantes
demonstrando liquidez para a obrigação principal através da apólice sem,
contudo, se desfazer de dinheiro ou inutilizando ativo pessoal ou empresarial.
A seguradora, por sua vez, é a
pessoa jurídica constituída especificamente para operar seguro (DL n. 73/66,
art. 73[vi] e
CC, art. 757, parágrafo único) e devidamente autorizada a fazê-lo pela SUSEP
(DL n. 73/66, art. 78), que garantirá o legítimo interesse do segurado contra o
risco predeterminado de inadimplemento do tomador, mediante o recebimento de
prêmio (CC, art. 757, “caput”).
Estruturalmente, ela é a empresa
responsável pela administração do fundo comum constituída pelo conjunto de prêmios
pagos pela mutualidade (segurados, beneficiários, tomadores, estipulantes, etc.)
cuja única finalidade é proteger interesses expostos a riscos predeterminados.[vii]
Um
ponto importantíssimo é a segurança jurídica e social decorrente diretamente da
idoneidade da seguradora, principalmente, sob o foco da responsabilidade
profissional do corretor de seguro pela indicação e a escolha do tomador, já
que, em síntese, ambos atuam no sentido de proteger o direito do segurado,
sendo que o próprio judiciário aponta que a inidoneidade é causa de rejeição da
apólice no processo.
Refletir
sobre idoneidade da seguradora é falar em capacidade de reserva técnica
operacional para liquidez e solvabilidade em face dos riscos assumidos por ela.
Todavia, também é falar no exercício do poder dirigente pelo Estado através do
CNSP (DL n. 73/66, art. 32) e o SUSEP (DL n. 73/66, art. 35) quanto a
fiscalização operacional, financeira e a autorização de assunção de risco,
conforme expressamente apontado pelo art. 79 do DL n. 73/66:
“Art. 79. É vedado
às Sociedade Seguradoras reter responsabilidades cujo valor ultrapasse os
limites técnicos, fixados pela SUSEP de acordo com as normas aprovadas pelo
CNSP (...)”
Em
outras palavras, sendo a seguradora inidônea para assunção do risco expresso na
apólice, concluir-se-á pela inexistência de reservas técnicas suficientes para
liquidação das obrigações assumidas com a mutualidade; assim, à critério único e exclusivo da SUSEP, cabe
a ela a tomada das providências cabíveis, conforme art. 89 do DL n. 73/66:
“Art. 89. Em caso
de insuficiência de cobertura das reservas técnicas ou de má situação econômico-financeira
da Sociedade Seguradora, a critério da SUSEP, poderá esta, além de outros
providencias cabíveis, inclusive fiscalização especial, nomear, por tempo
indeterminado, às expensas da Sociedade Seguradora, um diretor-fiscal com as
atribuições e vantagens que forem indicadas pelo CNSP.”
O
tema é extenso e profundo, porém a partir da estrutura do Sistema Nacional de
Seguro Privados instituído pelo DL n. 73/66 (art. 7º), que impõe rígido
dirigismo estatual (art. 1º e 2º) através do CNSP (art. 32) e da SUSEP (art. 35)
na constituição societária das seguradoras (art. 36), na autorização de
funcionamento, estruturação acionária e estatutária (art. 36, “a”), na autorização
de comercialização de cada um dos ramos securitários e na aprovação do
clausulado padrão para todas as operações (art. 36, “c”), na aprovação dos
limites financeiros de operação (art. 36, “d”), na fiscalização das condições
especiais da contratação, inclusive, com fixação da taxa financeira (art. 36, “e”),
na autorização e na fiscalização de todas as movimentações das reservas
técnicas de cada seguradora (art. 36, ‘f”), na fiscalização de todas as
operações de cada seguradora (art. 36, “h”), na realização da intervenção e liquidação
das seguradoras impedidas de operar (art. 36, “i”), não é razoável e justo
imputar aos corretores e aos tomadores o ônus de demonstrar a idoneidade das
seguradoras que eles não tem aptidão técnica de conhecer e não legitimidade
para fiscalizar. Ademais, é despropositado e desconfortante, diante de tão
intenso Poder Estatal no mercado segurador, acreditar que haja seguradora
inidônea operando como não faz sentido acreditar que existe carteira mutual de
risco segurado sem lastro na respectiva reserva técnica.
Em síntese, a relação jurídica
no seguro garantia judicial é bem definida como tridimensional: i)
segurado, ii) tomador e iii) segurador.
[i] http://tlma.com.br/o-segurado-no-seguro-garantia-judicial-reflexao-do-clausulado-padrao-da-susep/
[ii] Artigo específico sobre a
cobertura securitária do seguro garantia judicial - http://tlma.com.br/a-cobertura-do-seguro-garantia-judicial-reflexao-sobre-o-clausulado-da-susep/
[iii] STJ-3ª T., REsp n.
1.691.748-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 07.11.2017, Dje
17.11.2017.
[iv] TRT 2ª R.; MS
1003946-88.2017.5.02.0000; Terceira Seção Especializada em Dissídios
Individuais; Rel. Des. Fed. Rovirso Aparecido Boldo; DEJTSP 15/08/2018; Pág.
15742.
[v] STJ-3ª T., REsp n.
1.691.748-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 07.11.2017, Dje
17.11.2017.
[vi] Decreto-Lei n. 73, de 21 de
novembro de 1966, que sobre o Sistema Nacional de Seguros Privados, regula as
operações de seguros e resseguros e dá outras providências.
[vii] TZIRULNIK, Ernesto; CAVALCANTI,
Flávio de Queiroz B., PIMENTEL, Ayrton. O
Contrato de Seguro De Acordo com o Código Civil Brasileiro. 3ª edição, São
Paulo : Editora Roncarati, 2016, p. 62.
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